O Largo da Sé e o Terreiro de Jesus. O centro nascente da Capoeira de rua da cidade de São Salvador
Hoje é um centro de produção da Capoeira com as rodas de rua.
O Largo da Sé e o Terreiro de Jesus são localidades vizinhas, parte da mesma coisa. Mas cada lado guarda suas especificidades, seus membros fixos, aqueles que nunca saem do local, guardiões da área, eram camaradas daqueles da Baixa dos Sapateiros. De um lado estava Antônio Boca de Porco, do outro, Pedro Porreta Pedro Mineiro. Hoje é um centro de produção da Capoeira com as rodas de rua.
Para quem passa no Largo da Sé, encontra caminho por onde os pés de capoeiristas já pisaram. Merecidamente, Zumbi dos Palmares, ali ganhou altar, estátua, adoração daqueles negros conscientes da resistência à escravidão e do combate ao racismo até os dias de hoje. Zumbi é cantado nas rodas da Capoeira, assim como o Quilombo dos Palmares. Esses símbolos se juntaram à Capoeira, principalmente, a partir dos negros militantes e praticantes da Capoeira e das ações dos movimentos negros, os quais, mantiveram os movimentos quilombolas, das fugas, como uma das ações dos capoeiras.
O capoeira ficou como o fugitivo, o homem de coragem para enfrentar as forças milicianas que o perseguiram. Para os capoeiras, os quilombolas faziam o jogo da Capoeira, para se defender dos capitães do mato. Palavras do saudoso Mestre Ezequiel, de quem tanto ouvimos falar: "A Capoeira nasceu no Quilombo dos Palmares e Zumbi é o rei da Capoeira...", e cantava, "na roda jogava a noite inteira e Zumbi era o rei da Capoeira". A Capoeira, o Quilombo dos Palmares e Zumbi são símbolos da resistência negra no Brasil. Viva Zumbi dos Palmares!
O Largo da Sé era onde passava os capoeiras do passado, como Pedro Mineiro, Antonio Boca de Porco, Mestre Pastinha, Mestre Bimba, Mestre Caiçara. A Sé é território da Capoeira até os dias de hoje. Aspectos importantes devem de ser ressaltados em uma história que inclua o Terreiro de Jesus, praça situada ao lado do Largo da Sé, formando um corredor, que sobe até o Forte Santo Antônio, passando por o Além do Carmo. O local sempre foi frequentado pelos capoeiras, uma região estratégica para o encontro de grupos rivais. Foi um palco também das crianças nas ruas, capoeiras passavam o dia a correr, fazendo trampolias e jogando a capoeira. Ali era uma escola da Capoeira de rua, nascente de golpes e movimentos de agilidade fabulosos, invenções cotidianas. Temos diversos casos de crianças e adolescentes. Esses jovens formam o principal grupo de reprodução da prática cultural no século XX, tanto é que a maioria dos processados juridicamente na cidade de Salvador, por envolvimento com a cultura da Capoeira (66%), apresenta idade entre 16 e 25 anos, (16%) eram menores em um total de 99 pessoas.
Em 1901 o Jornal Diário de Notícias pediu providências ao "Sr Comissário do Distrito da Sé para uma malta de garotos que infesta o beco do Mota". Eram menores abandonados, crianças fugidas de casa e, em sua maioria, as que trabalhavam nas ruas e ao final do expediente retornavam as suas casas. Porém o grupo de crianças praticantes da Capoeira que tornou-se célebre foi os "Capitães da Areia", imortalizados na obra de Jorge Amado. Segundo o autor, os Pedro Porreta "Capitães da Areia"
tinham como mestre de capoeira o famoso Samuel Querido de Deus , exímio capoeirista, homem de grande estatura, respeitado por todos os praticantes e lembrado pela imprensa baiana como o rei da Capoeira nas primeiras décadas do século XX. A historiografia contemporânea não descobriu muitas coisas sobre o grupo, apesar de existir algumas fontes cinematográficas e literárias, mas sabemos que, pelo menos, até 1943, eles estavam dando trabalho à polícia "sobre a irregularidade que se vêm passando com saveiros que conduzem, para os vapores, de camboio, bebidas alcoólicas...sob a direção e comando dos célebres capitães da areia". Afirma que as crianças são gente sem profissão e de maus costumes, sem domicílio certo, vivendo nas areias.
As crianças e jovens ainda são muito importantes para os praticantes da Capoeira. Nos dias de hoje continuam sendo o principal grupo reprodutor da cultura. As crianças jogam, brincam, lutam a capoeira nas ruas, nas escolas, nas academias, nos espaços de moradia e tornam possível a sobrevivência de diversos profissionais da Capoeira. Mas a história do Terreiro de Jesus não para por aí. Podemos encontrar diversas gerações de "capoeiristas de rua", que continuaram a treinar e passar seus conhecimentos, fazendo exibições para os milhares de turistas que todos os anos estão a visitar a Bahia, até os dias de hoje.