Centro Esportivo de Capoeira Angola de Mestre Pastinha
A Capoeira, a partir de Mestre Pastinha, avança em seus princípios filosóficos e no imaginário de suas origens ancestrais.
A história do Centro Esportivo de Capoeira Angola se confunde com a história de Mestre Pastinha, o maior representante da Capoeira Angola no século XX. Ele criou métodos, desenvolveu movimentos de agilidade, golpes, regras e a parte lúdica da prática cultural. A Capoeira, a partir de Mestre Pastinha, avança em seus princípios filosóficos e no imaginário de suas origens ancestrais.
Mestre Pastinha nasceu no dia 5 de abril de 1889, na cidade de São Salvador. Era filho de José Pastinha, um espanhol, e Raimunda dos Santos, uma negra vendedora, que o ajudava no trabalho do mascate. Ele afirmou ter aprendido a Capoeira a partir dos dez anos, com um africano, chamado Benedito, negro natural de Angola. Mestre Pastinha, aos 12 anos de idade, foi para a escola de marinheiros e lá teria começado o trabalho de ensino da Capoeira. Saiu desse espaço após 20 anos de idade. Além do jogo do bicho, trabalhou de engraxate, vendedor de jornais, mas para ele esses ofícios eram passageiros. Ele afirmou: "minha arte é a de ser pintor, artista". Mestre Pastinha era letrado, tendo escrito um livro, e deixou farto material publicado pelo Mestre Doutor Dêcanio, aluno de Mestre Bimba.
A Capoeira Angola, assim como a Regional, surge de uma ruptura com a Capoeira do século XIX, mas os praticantes da Capoeira Angola apresentam várias propostas organizativas para a prática. Vamos acompanhar essa dinâmica a partir da proposta de Mestre Pastinha. A Capoeira Angola já vinha sendo desenvolvida por Samuel Querido de Deus, Barbosa, Onça Preta, Juvenal, Zepelin, Neném, Zei, Ambrósio, Barroso, Damião e outros. Samuel Querido de Deus foi seu principal nome no período anterior ao de Mestre Pastinha.
Em 1941, Mestre Pastinha retorna à prática da capoeira, após um período de afastamento. Ele recebe das mãos de Amorzinho, Antonio Maré e Aberrê o berimbau para conduzir a Capoeira de Angola. Isso aconteceu na Gengibirra, local de encontro dos capoeiristas, espaço dirigido por Amorzinho, um guarda civil, que faleceu na época. Mestre Pastinha tornou-se seu sucessor fundando o Centro Esportivo de Capoeira Angola (CECA). Entre os fundadores estavam: Amorzinho, Aberrê, Antonio de Maré, Noronha, Onça Preta, Livino Diogo, Olímpio, Victor H.U. e Alemão, filho de Maré.
Após a morte de Amorzinho, vários capoeiristas deixaram de frequentar o CECA, foram desenvolver seus próprios grupos. Mestre Pastinha levou adiante a proposta e em 1949 transferiu o Centro Desportivo para um terreno ao lado de uma fábrica de sabonetes, onde trabalhava como vigia. Depois foi para a Cidade de Palha (que pegou fogo e já não existe mais, sendo a atual Cidade Nova), ainda circulou por Brotas, até chegar ao Pelourinho. Mestre Pastinha teve como estratégia, na época, definir a Capoeira Angola no âmbito dos esportes, mas para ele, a Capoeira foi uma modalidade de luta que se distinguia de qualquer outra… "é lógico que me refiro a Capoeira Angola, a legítima, trazida pelos africanos e não a mistura de Capoeira com boxe, luta livre, jiu-Jitsu etc...", assim atacava a Capoeira Regional.
Mestre Pastinha constrói a Capoeira Angola em um campo de tradições africanas e em oposição a Capoeira Regional. Para ele a Capoeira vinha dos escravos africanos e teria se desenvolvido no contato com os índios, com os quilombos, nos canaviais, onde ganhou novos movimentos. Ele foi construindo uma visão de Capoeira enquanto resistência cultural. A Capoeira teria deixado de ser luta de ataque e ganha os movimentos de defesa e seus aspectos lúdicos. Mestre Pastinha passou a elaborar um plano de adaptação das características culturais da Capoeira a um modelo desportivo, a qual incluía uma série de categorias comuns a outras modalidades desportivas. Introduziu o uniforme preto e amarelo, inspirado nas cores do Ypiranga Esporte Clube, um time de futebol. Também não consentia que se jogasse descalço e sem camisa. Ele elaborou regras para o jogo da capoeira e, em suas demonstrações, ele proibiu uma série de golpes traumatizantes ou mortais, como "golpes de pescoço, dedos nos olhos, rabo de arraia, golpes no joelho e truques... todo os mestres tem por dever fazer ciente que é falta usar as mãos". A capoeira deveria de ser jogada com base em regras desportivas claras, teria que ter um "juiz".
Para Mestre Pastinha, o lado lúdico da Capoeira tem um papel de destaque, por isso ele criou o papel de "mestre de bateria e de canto", pois a Capoeira se diferencia, ganha beleza, leveza, com seus toques e poesias populares. Os instrumentos que compõem o conjunto da Capoeira Angola são: o berimbau, o pandeiro, reco-reco agogô e atabaque. Dessa forma, Mestre Pastinha sistematiza a parte lúdica da Capoeira em uma concepção artístico-desportiva. Entre os toques mais conhecidos ele citou o de "São Bento, o São Bento Pequeno, Santa Maria, Cavalaria, Amazonas...". Mestre Pastinha não esteve sozinho na construção da Capoeira Angola, uma nova tradição para a Capoeira, diferenciada da Capoeira de Besouro Mangangá, Caboclinho, Pedro Mineiro ou Antonio Boca de Porco. A Capoeira Angola nasce com algumas tendências, diferenciações superficiais desenvolvidas por Mestre Caiçara, Mestre Canjiquinha e Mestre Noronha.
Depois de sair da sua primeira academia próxima à Igreja Rosário dos Pretos, Mestre Pastinha fundou sua segunda academia no segundo andar do prédio onde hoje é a sede do Afoxé Filhos de Gandhi. Ficou pouco tempo nesse espaço.