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Igreja do Rosário e a Irmandade dos Pretos: A capoeira e a religiosidade

Existiram praticantes da Capoeira que tornaram-se importantes sacerdotes religiosos.

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Igreja do Rosário e a Irmandade dos Pretos: A capoeira e a religiosidade...

Em sua história os capoeiras sempre estiveram relacionados às instituições religiosas. No século XIX se empoleiravam nos adros das igrejas, fazendo exibições de agilidade, pendurados em cordas, rodopiando no ar. Participaram das irmandades religiosas e dos candomblés da Bahia. Existiram praticantes da Capoeira que tornaram-se importantes sacerdotes religiosos.

Professor Antonio Liberac Cardoso Simões Pires

Descricao Os praticantes da Capoeira sempre estiveram envolvidos com as religiões em suas diversas dimensões. Vamos a um caso ocorrido em 1926, envolvendo três famosos capoeiras da época, Antonio Boca de Porco, Eutychio das Malhadas e José Cyriaco…"Cerca de nove horas da manhã estava o respondente bebendo café num kioske existente no Areal das Docas...quando o individuo José Cyriaco, que estava em companhia de outros, a jogar búzios, se aproximou do respondente e disse o seguinte: então foi você que foi falar para Antonio Boca de Porco que eu queria dar no filho dele ?...e sacando de uma navalha vibrou profundo golpe". José Cyriaco feriu a Eutychio das Malhadas levemente, sendo processado por isso. Sua advogada de defesa parte para o ataque e declara nos autos processuais "jà está provado portanto que o denunciado que sempre teve ótimo comportamento foi agredido física e moralmente por Eutychio Alves da Silva, conhecido capoeirista e brigador costumaz".

Todos os envolvidos no caso eram famosos capoeiristas e Cyriaco, que trabalhava como alfaiate e morava na Estrada do Cabula, era conhecido Babalorixá, jogador de búzios e capoeira de grande agilidade. Esse caso demonstra a relação entre praticantes da Capoeira e as religiões afro-brasileiras. Nesse sentido o desenvolvimento cultural da Capoeira apresenta algumas características nitidamente de cunho religioso em toda a sua história.

Já no século XIX, em seu apogeu enquanto instituição social brasileira, os praticantes mantinham fortes relações com os santos católicos, as marcas no corpo contêm a Estrela de Salomão, símbolo importante entre os praticantes da Capoeira, até os dias de hoje presente nas cantigas, nos gestos rituais, nos nomes dos grupos, nos patúas... "santo antônio é protetor da barquinha de Noé". Assim o jogo da Capoeira carrega sua energia religiosa.

Os Orixás dos candomblés (Gegê-Nago, Angola, Ketu) também são referenciais que aparecem na cultura da Capoeira com maior frequência a partir do anos 40 do século XX. Os grupos de capoeiristas, artistas do palco, também vão buscar em seus espetáculos desenvolver aspectos da dança dos Orixás. As Irmandades foram referências importantes para diversos praticantes da Capoeira na cidade de Salvador. Já no século XVII, os negros se organizaram no interior das igrejas e estabeleceram relações institucionais com o Estado Eclesiástico, ocupando espaços, fundando capelas e criando mecanismos de resistência à escravidão, como compra de alforrias, visando a liberdade de seus membros.

Mestre Bimba, o criador da Capoeira Regional, também cultuava seus Órixás. Era casado com uma Babalorixá do "Candomblé de ketu", no Alto da Amaralina, na cidade de Salvador. Mestre Bimba construiu uma apresentação artística em seu grupo de Capoeira que incluía o samba de roda, danças do candomblé e a Capoeira. Suas cantigas regularmente saldam Deus… "Eeeee... viva meu Deus, Camará". Mestre Pastinha, maior representante da Capoeira Angola afirma que ele tem "fé e coragem para ensinar a mocidade do futuro... e está zelando pela maravilhosa luta deixada de herança da dança primitiva dos caboclos, do batuque e do candomblé, originada pelos africanos de Angola ou Gegês". Ainda afirma, "não sou católico, nem sou do candomblé, eu creio em Deus, num só, respeito todas gente de religião quando há respeito". Mestre Pastinha toma uma posição sincrética, posição essa que redireciona para o universo da Capoeira. Mas ele reconhece que a Capoeira "é religiosa, a mesma religião que vem do candomblé, o batuque, o samba, ela é da mesma parcela!", incluindo assim a Capoeira entre as práticas da cultura negra, que naquele período estavam sendo manipuladas pelas instituições culturais do Estado, os intelectuais de diversas matizes, e claro, pelos próprios capoeiras, sambistas e candoblecistas.

Mestres Patinha e Bimba desenham um fabuloso painel de concepções sobre a Capoeira, as quais retratam visões de vida, formas próprias de ver o mundo, e, principalmente, revelam um lugar político dos praticantes da Capoeira. Eles propõem uma Capoeira sincrética, integrada simbolicamente ao mundo das religiões afro-brasileiros e do samba, formando com eles uma tríade simbólica que poderia ser materialmente reproduzida de forma positiva na sociedade brasileira. Entretanto, seus praticantes são livres para cultuar seus deuses, seus espíritos, suas divindades, o que fosse sagrado.

A Capoeira é livre, indica o respeito religioso, o direito de cada praticante desenvolver suas orientações religiosas no espaço que desejar. A Capoeira retrata as crenças evangélicas, católicas, de matrizes africanas, budistas, muçulmanas e outras. Já podemos observar que a Capoeira é jogada por pessoas de diversas religiosidades. A Capoeira é um verdadeiro exemplo da luta pelo "respeito religioso. Na Capoeira não tem espaço para esse tipo de discriminação. Atualmente os espíritos de luz de Mestre Pastinha e Mestre Bimba são louvados na Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos.

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